Controle de cargas e o “vilão invisível” !
Num estudo recente do Colégio Americano de Medicina Esportiva (ACSM)(1), os cientistas acompanharam 54 pessoas (homens e mulheres) durante 10 semanas de treinamento de CrossFit utilizando como exercícios: agachamento, terra, arranco (snatch), clean (arremesso) e overhead press, além de exercícios de ginástica. Os participantes também seguiram uma dieta paleo durante o estudo. Os treinos foram ministrados por treinadores de Crossfit certificados e acompanhados por profissionais certificados do ACSM.
O objetivo do estudo era avaliar a influência deste método de treinamento (de alta intensidade) no VO2máx e na composição corporal.
Como resultados:
1) Aumento bastante significativo do VO2 máx tanto entre homens como em mulheres (aumento de 3 a 4 pontos de VO2). O aumento do VO2 mostrou que treinar de forma curta e intensa também melhora a capacidade.
2) Melhora também significativa na composição corporal, com os homens perdendo um pouco mais de gordura que as mulheres. Quanto a dieta o estudo não informa se os participantes puderam ingerir carboidratos após os treinos (o que pode ter contribuído também pro números de lesões abaixo).
3) 16% do total dos sujeitos (9 participantes) tiveram que desistir do estudo por motivo de lesão por sobrecarga. O alto número de lesionados mostra um indicativo que o uso de exercícios multiarticulares altamente técnicos de força pode causar quando são aplicados em situações de fadiga. Exercícios de LPO, agachamento e terra são extremamente técnicos e exigem uma técnica correta e um bom nível de força para que sejam benéficos.
O motivo do meu interesse pelo estudo é que ele se utilizou de exercícios de LPO (arranco e arremesso). O LPO é estudado desde os anos 70 e muita informação se tem a respeito de como utiliza-lo com segurança para o desenvolvimento da potência muscular. No entanto existem muito poucos estudos utilizando o LPO para treinar resistência de força. E este é de fato um problema: não existe ainda um protocolo de ajuste progressivo de cargas com baixo erro para isso. Muitos são baseados em tabelas de numero de repetições, outros em Peso Corporal (PC) e até mesmo por tempo. Portanto são sistemas empíricos e subjetivos com uma margem considerável de erro na dosagem.
Minha avaliação pessoal do problema é o excesso de sobrecarga aliado a um baixo padrão técnico. Se os exercícios são mal executados em diversas repetições (pois se está lutando contra o tempo!) reforça um padrão motor ruim que anula a formação de um padrão de movimento ideal. Portanto a baixa qualidade técnica por si só já aumenta o potencial lesivo dos exercícios.
O excesso de sobrecarga é o “vilão invisível”. Somente é percebido por quem tem um maior conhecimento sobre o controle de cargas no LPO!
Veja uma informação relevante: o valor de 1RM no arranco tem correlação positiva com 1 RM do agachamento completo, sendo este por volta de 65-70% do valor obtido no agachamento (2). Ou seja, se um atleta agacha completo com 90kg, é esperado que o seu 1RM de arranco esteja por volta de 58-63kg. Claro, esses valores não são estanques, mas são bem próximos da realidade no LPO competitivo, portanto podemos assumir que para indivíduos amadores a margem de erro seja bem baixa. Se o valor padrão de cargas estabelecido nas competições de Crossfit é de 135lbs (61.2kg) para homens e 95 lbs (43 kg) para mulheres (3), significa que de forma teórica um atleta masculino teria que ter um agachamento completo de aproximadamente 160kg e o feminino de 125kg respectivamente para que essa sobrecarga caia dentro da faixa de resistência (50-60% 1RM para umas 15 repetições . Esse valor estou me baseando nas tabelas clássicas de porcentagem/reps)(4).
Evidente que não estou preocupado com os atletas competitivos que certamente devem possuir o grau necessário de força, habilidade técnica e tempo de treinamento. Minha preocupação é com quem está iniciando. As cargas são diminuídas geralmente de modo arbitrário caindo no “tentativa e erro”. Portanto o controle de sobrecarga cai numa margem de erro grande, afinal qual seria o parâmetro pra se determinar o leve e pesado?
Uma possível solução seria os iniciantes passarem primeiro por um programa de 4 semanas de treino de força de agachamento completo combinando o ensino dos educativos de LPO ao longo deste tempo. No final desse período poderia se determinar o 1RM do agachamento e assim se retirar os valores de carga do LPO. Esses valores seriam mais adequados ao nível de força individual – controlando assim o erro do excesso de sobrecarga. Esta é uma questão que se põe a prova pros treinadores: modificar a sequência do programa ou mantê-lo?!
(Prof. João Coutinho)
(1) Journal of Strength & Conditioning Research. 2013 Feb 22. [Epub ahead of print].
(2) Livro Força e Potencia no Esporte: Lev. Olímpico. Ed Ícone (2010)
(3) Página: //games.crossfit.com
(4) Página: //exrx.net/WeightTraining/Guidelines.html
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One thought on “Controle de cargas e o “vilão invisível” !”
Ótimo texto João!
Particularmente não sou contra o Crossfit, sou contra maus treinadores. Em qualquer área. Pq são pessoas assim que nivelam por baixo um bom profissional de educação física.
abs