
Caracterização do jogo de Futebol
É com imenso prazer, que a partir de agora, periodicamente, estarei escrevendo artigos para o site, sempre voltado ao treinamento no futebol, uma parceria minha com o TE.com e o Prof. João Coutinho.
Para começarmos a série de artigos, optei por começar com um tema já muito abordado na literatura, porém de fundamental importância para toda e qualquer pessoa que se interesse pela preparação física voltada ao futebol.
O presente artigo de revisão abordará detalhadamente sobre a CARACTERIZAÇÃO DO JOGO, ou seja, iremos conhecer como ocorre a movimentação dos futebolistas dentro da uma partida de futebol.
É imprescindível conhecer a estrutura competitiva dos jogos, ou seja, os aspectos qualitativos e quantitativos de uma partida de futebol e sua influência nos sistemas biológicos dos futebolistas e por conseqüência qual a melhor carga a ser ministrada.
O futebol é um esporte que implica a prática de exercícios intermitentes, de intensidade variável (Ekblon 1993; Zeederberg et al 1996), onde aproximadamente 88% de uma partida envolvem atividades aeróbias e os 12% restantes, atividades anaeróbias de alta intensidade. (Shepard e Leat, 1987; Reilly, 1996), que são os momentos decisivos do jogo, portanto os mais importantes.
A movimentação do futebolista é complexa e variada e consiste em: andar, trotar, correr em velocidades média e alta, ficar parado, arrancadas explosivas, trocar de sentido e direção, disputar bola corpo a corpo, saltar, paradas bruscas, sustentar fortes contrações mantendo o equilíbrio e o controle de bola contra uma pressão adversária etc, onde andar representa 40,4%, posição estática 17,1%, corrida em intensidade baixa 35% e corrida em intensidade alta 8,1%, segundo estudos de Bangsbo et al (1991) e Mujika et al (2000).
DISTÂNCIA PERCORRIDA
A distância percorrida durante uma partida de acordo com Bangsbo dependerá da qualidade do oponente, nível de competição, tática, importância do jogo, motivação, tipo de grama e condições ambientais. Ainda segundo o mesmo autor, em partidas de alto nível, ocorrem mais ou menos 1100 trocas de atividades e a distância percorrida com a bola varia de 0,5 a 3% do total e a distância total percorrida varia menos de 1 km de uma partida para outra, sendo a maior variação1,7 km. No 2º tempo das partidas a intensidade do jogo reduz e a distância total percorrida diminui entre 5 a 10% comparado ao 1º tempo.
Com o significativo aumento da condição física no futebol, o desempenho total de corrida, em muitos casos cresceu 100% ou mais com o passar dos anos, e as exigências sobre o desempenho da resistência aeróbia aumentaram imensamente. Desde 1962 comprova-se um aumento médio anual de 10% na performance de corrida segundo Bauer (1990).
Conforme Dufour (1990), citado por Cometti (1999), em 90’ de jogo, apenas 60’ são de jogo. Desses 60’, os futebolistas de acordo com suas posições correm somente de 20 a 40% ou seja, de 12 a 24’, sendo uma média de 3 km de marcha e 7 km de corrida. Desses 7 km , 64% são de corrida lenta, aeróbia, 22% de corrida com ritmo médio anaeróbio (cerca 80% Vo2 máx, entre 10 e 17 Km/h) e 14% corrida alta intensidade (entre 18 e 27 Km/h).
Stolen et al (2005) no maior artigo de revisão acerca do futebol, verificou que jogadores de elite percorrem de 10 a 12 km por partida com média de 10 km, e os goleiros 4 km em média. A Premier League (Campeonato Inglês) apresenta distâncias de até 15 km (Rienzi et al. 2000).
Estudos de Onashi (1987), no campeonato japonês, em análise por vídeo apresentou os seguintes resultados por posição: defensores 9303 metros, meio-campo 11601 metros, atacantes 10387metros.
Bangsbo, também em análises por vídeo, no campeonato dinamarquês, verificou que os futebolistas percorrem em média 10,8 km, com mínimo de nove e máximo de 14 km, goleiros 4 km.
Turíbio (2002) em estudo com 1000 futebolistas profissionais do São Paulo F.C.em partidas oficiais por seis anos, chegou aos seguintes valores para o futebol brasileiro: zagueiros 8,8 km; laterais 9,5 km; volantes 9,5 km, meias 9,9 km, atacantes 8,2 km. Média de distância percorrida 9,3 km.
Os laterais, normalmente apresentam condicionamento físico acima da média, com capacidade aeróbia 15% maior em relação as demais posições , e percorrem maiores distâncias com bola (230 metros)
A distância percorrida pelos meio-campistas é significativamente maior que a dos zagueiros e atacantes em valores médios encontrados na literatura.
Os Futebolistas de meio-campo ficam parados por 14% do jogo, significativamente menos que os zagueiros 21,7% e atacantes 17,9% (Bangsbo et al, 1991), isso provavelmente por serem o elo entre a defesa e o ataque, o que requer mais tempo de corrida. Os meio-campistas percorrem grande parte da distância total durante o jogo em baixa intensidade e os atacantes a maior parte do jogo sob forma de sprint. Menos de 2% da distância percorrida por futebolistas profissionais é com posse de bola. (Reilly 1994, 1996,1997)
Mais uma vez, segundo estudo de Bangsbo, a intensidade do esforço de um futebolista durante a partida, depende do seu nível de condição física e de sua função tática na equipe. Defensores e atacantes cobrem aproximadamente a mesma distância, porém a distância foi significativamente menor que a coberta pelos meio-campistas. Em geral os jogadores de meio–campo têm melhor condicionamento físico.
Ainda segundo Bangsbo, não há diferença entre, atacantes, meio-campistas e defensores para corrida com alta intensidade, porém os meio-campistas executam mais corridas de baixa velocidade. Os meio-campistas não só correm a pouca velocidade com maior freqüência, mas com uma maior duração refletindo seu papel tático e a quantidade de condução de bola dos jogadores de meio e especialmente os atacantes é 2x maior que os zagueiros, no entanto os zagueiros em 2 ou 3 x mais executam a interceptação da bola a mais que os atacantes.
Exatamente esta especialização das funções nos jogos é que deve ser levada em conta para a planificação das cargas dos treinamentos. (Morozov, Bescov, 1977)
De acordo com a posição do futebolista, comprova-se um comportamento característico de corrida. Os futebolistas de meio-campo têm, em média, o programa de corrida mais intenso, em função do seu papel de ligação entre defesa e ataque (Weineck,2000)
FREQUÊNCIA CARDÍACA
Os futebolistas apresentam FC de 150 a 190 bpm durante a maior parte do jogo, descendo de 150 em breves períodos. (Bangsbo)
Ainda segundo estudos de Bangsbo, estima-se que a intensidade média durante uma partida é de aproximadamente 70% do consumo máximo de oxigênio.
Estudo de Rhode e Espersem (1998), aponta que em 11% do tempo de jogo a FC apresenta valores inferiores a 73% da FC máx, 63% entre 73 e 92% da FC max, e 26% valores superiores a 92% da FC max.
SPRINTS
O esforço do futebolista está caracterizado sobretudo por esforços explosivos, onde esses são repetidos intermitentemente um elevado nº. de vezes, ou seja, o jogo de futebol nada mais é do que uma sucessão de sprints (Cometti,1999 e 2002), com constantes trocas de sentido e direção, onde esses estímulos são na sua grande maioria em distâncias bem curtas, com duração média de 2 a 4”. Sprints constituem 11% da distância total percorrida durante a partida (+ ou – 1100 m). Isso corresponde a 0,5 a 3,0% do tempo de bola em jogo.
Weineck (2000), diz que o percurso total percorrido em forma de sprints está situado entre 500 e 3000 m para um nº. de 40 a 100 sprints por jogo e em alguns casos essa marca é consideravelmente ultrapassada e esses sprints são na sua maioria até 25 metros e as acelerações ultra curtas (5m) e curtas (até 25m), são características do jogo de futebol.
Já Shepard, (1990) afirma que 8 a 12 % da distância total coberta durante um jogo são realizadas em velocidade de sprint com mudança de velocidade e direção a cada 5 segundos.
Estudo de Bizanz e Gerish (1988), durante a copa européia de 1988 na Alemanha concluiu que as acelerações curtas de 0 a 5m são predominantes nos jogos e são realizadas 2x mais que as distâncias de 5 a 10 m e 10 a 20m e cinco vezes mais que em distancias maiores de 20m.
Há uma relação entre a qualidade do futebolista e a realização de exercícios de alta intensidade durante um jogo (Bangsbo et al 1991; Reilly 1994; Withers et al 1982). Devido a isso futebolistas da 1ª divisão se exercitam em alta intensidade por mais tempo que os de divisões inferiores (Ekblon 1986). Segundo Mujika et al, 2000, há uma relação entre qualidade do jogo e a quantidade de exercícios de alta intensidade realizados durante a partida. Resultados de estudos de Bangsbo demonstram que quanto mais alto o nível do futebol, mais elevada era a intensidade da corrida executada.
Os exercícios de alta intensidade são realizados durante 5% do tempo total de partida e a média da relação descanso – atividades de baixa intensidade – atividades de alta intensidade é de 3:16:1.Essa relação sugere que a maior parte da energia demandada pelo futebol é de natureza aeróbia com períodos de exercícios de alta intensidade raros e curtos (Rienzei et al 2000; Withers et al 1982).
A distância percorrida em velocidade máxima também diminui na segunda metade do jogo por causa da fadiga e de outros fatores como os resultados parciais (Ali e Farraly 1991) e na maioria das vezes as corridas de velocidade máxima não superam 20 metros (Winkler, 1985). Reilly e Thomas (1976) verificaram a realização de uma corrida de velocidade máxima, em média, a cada 90 segundos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
– Cometti,G.Fútbol e Musculacion, INDE, Barcelona, 1999.
– Weineck, J.Futebol Total: O Treinamento Físico no Futebol, Phorte, 2000
– Bangsbo, J. Entrenamiento de la Condicion Física em el Fútbol, Pai do Tribo, Barcelona.
– Stolen T. Physiology of Soccer. Sports Med 2005.
.: Jairo Porto, Preparador Físico Futebol de times da série A e B no Brasil
.: Pohang Steelers ( Coréia do Sul): Campeão Copa da Coréia 2009, Campeão Asiático 2009 e Terceiro colocado no Mundial de Clubes da FIFA 2009.
.: Palestrante em cursos de futebol; formado na UGF – RJ 2000
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13 comments
Excelente iniciativa e sem palavras para o artigo… define o que está sendo o atual futebol e abre uma visão acerca do que pode ser planejado para os treinos dos futebolista! Parabéns Jairo Porto.
Caro Wagner,
Obrigado pelo apoio e partir de agora periodicamente estari escrevendo sobre o treinamento voltado para o futebol para o site.
Qualquer coisa entre em contato com o meu email jairoporto@gmail.com.
Obrigado pelas palavras e pelo apoio
Grande abraco
PArabens Jairo!!! toda essa caracterizacao do jogo e de suma importancia para individualizar a praparacao fisca de nossos atletas.
Dados estatísticos são sempre interessantes pois nos fazem refletir sobre uma série de procedimentos. O problema é que no futebol existem tantas variáveis (calor, chuva, campo, motivação, etc.) que fica difícil analisar tudo na ponta do lápis. Mesmo assim, esse artigo veio nos ajudar com um pouco mais de informações. E as crianças, como devem ser preparados as crianças?
Parabéns professor, com essa caracterização do futebol em nível mundial, todos esses dados são muito interessantes para um treinamento mais específico.
Boa Tarde, sou responsavel pelo site http://www.futeboldebase.com.br e achei muito interessante o artigo e gostaria da autorização para publicarmos no nosso site, citando todas referencias inclusive o site.
Agradeço e Aguardo respostas.
Danilo
ola Danilo, você pode publicar o artigo no seu site. Coloque a referencia do site e um link pro original. Se quiser pode postar os outros artigos de futebol se quiser.
Parabéns pelo site.
Forte abraço
Excelente Jairo, parabéns pelo artigo!
Abraço,
Alberto Tenan – Treinamento Futebol.
Parabéns pelo artigo Jairo! Muito esclarecedor e atual.
E sua grande competência reside em conseguir APLICAR a ciência ao momento prático deixando de ser apenas um teórico. Parabéns !
Rommel Oliveira.
Bom artigo Jairo! Ficarei atento às novidades. Sou Profº de Educação Física e o meu trabalho está baseado no futebol. tudo que tiver sobre este tema me interessa.
Um forte abraço! Ademir
Conheço o professor JAIRO desde os tempos em q ele já se destacava no futsal.Para nós todos é um grande privilégio poder sorver sua sabedoria, através de ótimos artigos.Parabéns
Boa noite Jairo, sou Professor especialista em treinamento de força e fisiologia do exercício. Parabéns pelo trabalho.
Gostaria de saber como os preparadosres f´sisicos de futebol fazem um programa de periodização tendo em vista, o futebol ter muitas partidas com intervalos curtos. Como traçar metas para que o programa ter sucesso com o grande números de jogadores?
Boa noite, sou André Bueno recém formado em educação física.
Estou entrando em contato para pedir um auxílio.
Estou trabalhando em uma escolinha de futebol e preciso montar um planejamento de 10 aulas de 1h:30min no mês para alunos de 12/13/14 anos buscando melhorar preparo físico e técnica, pois são alunos que estão passando por testes em times profissionais. Gostaria de saber se o professor pode me auxiliar com algum tipo de material, referencia, ou até com dicas para montagem das aulas, que tipo de exercícios utilizar, circuitos, testes etc.
A minha idéia é utilizar 30 min de preparo físico, 30 minutos de trabalhos técnicos e em alguns treinos 30 minutos de coletivo. Quando não houver o coletivo, aumento os trabalhos para 45 minutos de fisico e 45 de técnico. Isso vai ocorrer 2 vezes por semana. Pensei em inicar fazendo algum tipo de teste, como por exemplo o shuttle rum, e depois de uma mes trabalhando, avaliá-los de novo para verificar os niveis de melhoras.
Mas ainda estou meio perdido na montagem das aulas e identificação de quais testes e exercícos usar, pois estou começando agora. Será que o professor pode me auxiliar de alguma forma?
Desde ja obrigado